Experiências dos Químicos e Metalúrgicos da CUT foram apresentadas e debatidas em seminário sobre nanotecnologias no Rio Grande do Sul
O IX Seminário Internacional Nanotecnologias, Sociedade e Meio Ambiente, realizado entre 20 e 24 de outubro na Escola de Direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), em São Leopoldo (RS), teve como principal tema de debate a regulação das nanotecnologias, tendo em vista as incertezas em relação aos riscos que representam à saúde e ao meio ambiente.
A abertura do seminário foi feita pelo professor José Manoel Cózar-Escalante, da Universidade de La Laguna, na Espanha, que abordou aspectos relacionados à ética em nível molecular, a partir dos riscos á saúde e ao meio ambiente associados às nanotecnologias.
“Nanotecnologias e Sociedade: desafios e perspectivas” foi o tema de interessante debate entre o professor e ativista ambiental argentino Mauricio Berger e o tecnologista brasileiro Luis Renato Balbão Andrade. Berger é membro do Conselho Nacional de Investigações Científicas e Técnicas (CONICET), órgão do governo da Argentina, e é professor no Instituto de Investigação e Formação em Administração Pública, da Universidade Nacional de Córdoba, na Argentina. Luís Renato trabalha na Fundação Jorge Duprat Figueiredo, de Segurança e Medicina do Trabalho (FUNDACENTRO), vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego, no centro estadual do Rio Grande do Sul.
Outra sessão de debate de grande interesse abordou a soberania alimentar e sua relação com as nanotecnologias. O engenheiro agrônomo Richard Dulley, da Renanosoma, e Steve Suppan, do Instituto Para Agricultura e Política Comercial, organização não-governamental dos Estados Unidos, analisaram a regulação existente em relação a produtos alimentícios que já são comercializados, no Brasil e nos EUA, e que utilizam nanotecnologias. Na mesma sessão, a professora Tânia Magno, da Universidade Federal de Sergipe, fez considerações sobre a importância de se pesquisar a fundo a relação das nanotecnologias com a indústria de alimentos, e suas interfaces com problemas de saúde pública, como a obesidade infantil.
O movimento sindical participou como expositor e debatedor na sessão sobre nanotecnologias e mercado de trabalho. Mauro Soares, do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e diretor da Confederação Nacional dos Metalúrgicos (CNM) da CUT, apresentou a experiência da CNM em se apropriar do tema em cursos de formação visando analisar impactos das nanotecnologias à saúde dos trabalhadores. Mauro, que também representa a CUT na Comissão Nacional Tripartite Temática que discute normas regulamentadoras de segurança para o trabalhador, contou das dificuldades em obter junto às empresas dos setor metal-mecânico informações sobre o uso de nanotecnologias no processo produtivo e ressaltou a importância da Fundacentro na formação de dirigentes e militantes sindicais sobre o tema. “O Seminário Internacional Nanotecnologias, Sociedade e Meio Ambiente se afirmou no cenário acadêmico e sindical pela qualidade dos debates que promove e por sempre promover o diálogo entre cientistas e representantes da sociedade, interessados nos impactos das nanotecnologias, caso do Movimento Sindical”, afirmou.
Thomaz Ferreira Jensen, economista do DIEESE na subseção do Sindicato dos Químicos do ABC, relatou a experiência de negociação coletiva dos Químicos da CUT no Estado de São Paulo que garantiu, em abril de 2012, a inclusão da inédita cláusula na Convenção Coletiva de Trabalho negociada com a indústria farmacêutica, garantindo acesso á informação sobre o uso de nanotecnologias nos processos produtivos, ricos e medidas de proteção adotadas. Para saber mais sobre a negociação da indústria farmacêutica, acesse:
http://www.fetquim.org.br/site/opiniao/?codigo=26
O economista do DIEESE também apresentou uma estimativa do número de trabalhadores na indústria química paulista potencialmente expostos às nanotecnologias. Com base na Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho e Emprego, em 2013, eram cerca de 9.800 trabalhadores atuando em atividades de pesquisa em laboratórios na indústria química instalada no Estado de São Paulo, cerca de 3% do total de trabalhadores químicos no Estado. Estes trabalhadores são aqueles que, hoje, devem já estar em contato com a manipulação de nanopartículas, visando à produção. Mas há que se considerar que outros quase 188 mil trabalhadores nas linhas de produção também podem estar expostos às nanotecnologias, sem ao menos saber isso. Para Thomaz, “é necessário desenvolver, através na Negociação Coletiva, outros elementos regulatórios mínimos que orientem a gestão segura das nanotecnologias e dos nanomateriais manufaturados, e atuar pela elaboração de regulação pelo Estado em relação às nanotecnologias no Brasil”.
E foi precisamente sobre as possibilidades de regulação das nanotecnologias no País que debateram dois destacados professores de Direito, especialistas no tema. Para Wilson Engelmann, coordenador do JusNano, grupo de pesquisa vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Direito da UNISINOS, é interessante potencializar experiências de regulação, como a dos Químicos, que talvez sejam passos importantes para que se elabore uma regulamentação, ou seja, elaboração de normas pelo Estado em relação ao tema. Engelmann é co-autor, com Raquel Von Hohendorff, do livro “Nanotecnologias aplicadas aos agroquímicos no Brasil: a gestão dos riscos a partir do Diálogo entre as Fontes do Direito”, lançado durante o XI Seminário. Nesta valiosa obra, são abordados, por exemplo, as nanopartículas de agrotóxicos, que as transnacionais Monsanto, Syngenta e BASF estão desenvolvendo. São agrotóxicos fechados em nanocápsulas ou compostos de nanopartículas, o que faz com que sejam mais facilmente absorvidos pelas plantas, além de possibilitar liberação prolongada destes agroquímicos nas lavouras.
O advogado e professor Reginaldo Pereira, da UNOCHAPECO (Universidade Comunitária da Região de Chapecó), analisou as tentativas de criação de um marco regulatório específico para as nanotecnologias no Brasil, com destaque para o pioneiro projeto de lei 5076/2005 de autoria do Deputado Federal Edson Duarte (PV-Bahia), que propunha a criação de uma Política Nacional de Nanotecnologia, o incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico e o controle, pelo Poder Público, dos riscos e impactos decorrentes das atividades relacionadas com esta tecnologia.
Entre as inovações deste projeto, destacadas por Pereira, estavam a criação da CTNano (Comissão Técnica Nacional de Nanotecnologia), a ser constituída por 26 cidadãos brasileiros de reconhecida competência técnica, notório saber científico e com destacada atividade profissional em nanotecnologia e formação em nanossegurança, distribuídos entre as sociedades científicas, os Ministérios do Governo Federal e as entidades representativas, o que incluiria o Movimento Sindical. Pelo projeto, todo cidadão brasileiro deveria ter acesso às reuniões da CTNano, que deveriam ser públicas.
Lamentavelmente, o projeto foi arquivado em 2008, após receber pareceres desfavoráveis das Comissões de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio e de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, da Câmara dos Deputados, sob o argumento de que sua aprovação criaria “injustificáveis entraves para o desenvolvimento técnico-científico no Brasil”.
Pereira analisou também o Projeto de Lei 6741/2013 do Deputado Federal Sarney Filho (PV-Maranhão), sobre uma Política Nacional de Nanotecnologia, contemplando a pesquisa, a produção, o destino de rejeitos e o uso da nanotecnologia no país. Este projeto é fruto de audiência pública realizada pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, em Brasília, no dia 13 de dezembro de 2012, reunindo especialistas do Governo Federal, de Universidades e do Movimento Sindical, que analisaram a situação das nanotecnologias no Brasil. Para mais detalhes desta audiência, acesse:
http://quimicosabc.org.br/noticias/audiencia-publica-na-camara-dos-deputados-analisa-nanotecnologias-no-brasil-1492/
O projeto de lei segue em tramitação na Câmara dos Deputados, e deve avançar, uma vez que o Deputado Sarney Filho foi reeleito este ano. Há pontos, segundo o professor Pereira, que precisam ser melhorados no projeto. “O projeto apenas informa que a gestão da nanotecnologia será compartilhada pela União, Distrito Federal, Estados, Territórios e Municípios, cabendo à União a coordenação da Política Nacional de Nanotecnologia, sem, no entanto, propor um sistema para que este gerenciamento compartilhado se efetive. Outro ponto problemático é a ausência de previsão de um Comitê Técnico”, afirmou Pereira.
O seminário também contou com apresentação de pôsteres com resumos de trabalhos de pesquisa desenvolvidos por estudantes da UNISINOS e de outras Universidades abordando questões regulatórias associadas às nanotecnologias.
Também foram oferecidos cinco mini-cursos aos participantes do seminário, com temas como “as nanotecnologias como um exemplo de tecnociência” e “os marcos e ferramentas éticas nas tecnologias de gestão”.
A programação completa do seminário pode ser acessada em:
http://jusnano.blogspot.com.br/
E as apresentações feitas pelos palestrantes podem ser solicitadas através do endereço: jusnano@gmail.com